Estamos hoje transeuntes num furacão de informações, sensações, perdidos numa realidade histórica que parece estar à frente de nosso tempo. É verdade que nós guardamos um baú de objetos antigos, informações que muitas vezes perderam a utilidade, outras que nos resguardam, nos garantem alguma segurança.
Essa
turbulência em que vivemos, esse mundo inundado de informações, altamente
interativo, sempre o foi, mas agora se amplificou em suas inúmeras
possibilidades e impossibilidades que nos deixam, por vezes, confusos ao sabor
dos desencontrados movimentos que 'marolam' confusos nesse oceano de
incertezas, ou de certezas demais.
Alguns
estudiosos insistem em afirmar que estamos na era da desinformação, devido à
imensa quantidade de informações visuais, sonoras, tácteis, sem contar as mais
específicas a que somos bombardeados. Concluem eles que estamos atônitos sem
saber o que fazer com tanta informação, sem saber que destino dar a elas.
Vários
visionários, como o canadense Marshall MacLuhan, previram um período em que a
informação seria abundante, a democracia seria muito mais interativa. Esses
prognósticos vieram praticamente no momento do nascimento da internet ou dos
experimentalismos que levariam a sua criação na década de 60.
Certamente
ambas as correntes e contracorrentes (humanista e tecnológica) estão corretas.
É certo que se ampliou abundantemente o acesso à informação. Nem falo da
internet, ainda de muito restrito acesso, mas dos meios de massa que se
ampliaram aceleradamente na ultima metade do século passado. Como meios de
massa, estou considerando uma ampla variedade de empreendimentos
comunicacionais não apenas as redes de televisão, rádio e mídia impressa, mas a
internet, shows musicais e teatrais, filmes, panfletos com maior circulação,
rádios comunitárias e corporativas, uma série de eventos, acredito que se possa
caracterizar devido a especificidades regionais meios mais restritos como de
massa.
Há tanta
informação disponível que não conseguimos absorve-los e quando as absorvemos
aumentamos, por vezes, uma 'cultura inútil'. É verdade que esta sempre existiu,
mas nunca em tamanha quantidade ocorreu de informações passarem uma vida sem
utilidade. Calma gente! Não pretendo nunca me tornar um utilitarista. Essa
doutrina é muito pratica e pouco ética. Apenas digo que em nenhum outro momento
da história as informações criaram tantos analfabetos. Nem falo de
analfabetismo digital, mas informações, por exemplo, de como se lavam elefantes
na Índia para um esquimó do Alasca que periga nunca ter visto um elefante.
Estamos, pois,
num mundo globalizado onde imperam as grandes transnacionais e o mercado sobre
os estados nacionais. A lógica do mercado é perversa, sobretudo num contexto
neoliberal, pois ao mercado só interessa lidar com consumidores e transformar
qualquer produto, informação em mercadoria rentável.
Hoje todos os
serviços e produções de qualquer natureza têm a mesma característica de uma
manufatura, quer dizer são produzidos por uma indústria: a indústria cultural e
comercializados como qualquer produto industrial. Para isso os filósofos da
Escola de Frankfurt já diziam que se pauperiza a cultura de modo a torná-la
mais acessível a um maior número de consumidores. A indústria cultural utiliza
técnicas falsamente neutras para pasteurizar a cultura tornando-a asséptica.
Quer dizer retirar o conteúdo ou valor de uma cultura não é uma ação neutra.
Assim torna os produtos universais ao retirar os empecilhos culturais que
dificultariam sua absorção por um maior numero de consumidores.
Esse é um
processo que não é nada novo e foi descrito há muito tempo. Mas o que é novo
agora é que com o endeusamento do mercado produzido pelo neoliberalismo
globalizante, as relações foram invadidas por uma lógica comercial. Essa teia
globalizada aparentemente tem nas pontas os consumidores. A dimensão humana a
cada dia é mais sucateada nessas novas relações, dando espaço a condutas
formais acríticas.
Essa lógica já
penetrou na educação ainda no século passado com as famosas educações para a
produção e fordista. A educação é uma indústria cultural privilegiada, pois
forma os consumidores. A educação, apesar das teorias pedagógicas inovadoras,
meramente reproduz os valores da sociedade, não consegue cumprir um de seus
papeis que é produzir o futuro.
É certo que
vivemos num mundo em que a informação se voltou a ser mecanismo de poder. A
informação era mecanismo de poder na Idade Média. Época em que os livros
estavam guardados nos mosteiros e havia uma severa classificação e censura dos
livros que poderiam ser lidos. Uma forte guarda dos que não poderiam ser lidos
por 'mentes mais fracas, menos resistentes à tentação'. Um aspecto do poder
político da Igreja Católica neste período o qual poderíamos muito melhor
caracterizar dentro do Materialismo histórico como Feudalismo.
Agora retorna
a ser mecanismo de poder. Só que quem a controla não é mais uma instituição,
mas sim os burgueses. Portanto se faz necessário maquiar fortemente a
concentração para não deslegitimar os ideais que os levaram ao poder. É
necessário também para eles manter acesa uma promessa. Se para as religiões que
nasceram no oriente médio o céu é a promessa necessária, para o capitalismo era
necessário três promessas: liberdade de associação, igualdade de condições para
lutar e fraternidade como um resquício de humanidade no frio coração do
sistema. Hoje só necessita fazer uma promessa, sem condições de cumprir como as
outras: consumo para todos.
Hoje
consumimos praticamente tudo o que podemos. Tudo é produto, inclusive nossas
relações. Olha estou falando em regra geral, e como sabemos regras gerais só
tem exceções. Cada ser humano é uma especificidade em si, um particularismo
profundo, mas não há dúvida de que mesmo os mais virtuosos caem em várias valas
dessas. Acredito que muitos não têm consciência disso. Ninguém tem consciência
plena afinal, mas muitos como eu gostariam. Voltando ao assunto há um excesso
de informações disponíveis só que organizadas de modo caótico. Essas mesmas
informações, embora disponíveis, estão naturalmente codificadas de modo que só
quem é da área ou conhece profundamente o código pode facilmente decifrá-las.
Creio que compliquei. Mas é fácil: não me peçam para ler uma planta
de engenharia eu provavelmente não entenderei nada.
Então quase
tudo está disponível a uns poucos. Mesmo assim desses poucos que tem o acesso
pouco poderão codificar/entender/assimilar porque é impossível terem acesso a
muitos códigos. São códigos que levam anos para se adquirir. Esse é outro
defeito do cartesianismo na educação: ao separar as partes, cria um monte de
analfabetos para as outras. Entretanto qualquer leitor, com toda autoridade,
poderia argumentar que se tivéssemos uma visão global seríamos analfabetos para
tudo. Por certo, se pensarmos com nosso cartesianismo, por certo. Mas tivermos
uma visão holística, de holos - total, somos obrigados a ter uma ideia complexa
da vida. O que ao contrário do que parece simplificaria muito nossa convivência
devido à ideia antropológica das culturas e éticas profundamente respeitosas,
ecológicas e holísticas com a de Baruch Espinosa.
Se nossa
preocupação fosse com o sistema como um todo e não com peças isoladas dele.
Tudo seria muito mais fácil e legível. Diminuiriam significativamente as
especificidades, pois não estaríamos preocupados em teorizar sobre a arruela
para quem se interessa por arruela e sim preocupados em falar sobre o universo
para quem vive nele. Não tenho a menor pretensão de defender a unificação das
culturas e o fim das diferenças destas ou o nivelamento destas por baixo via
domínio cultural. Imperialismo Americano, Francês, Bielo-Russo ou Jamaicano é
tudo a mesma porcaria !!! Nunca defenderia isso. O que defendo é que adotemos
como ética ideal algo próximo do 'paradoxo' de Kant: Fazer o maior bem a todos,
provocando o menor mal possível.