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quarta-feira, 21 de maio de 2025

Incoerências

 


Hoje pensei em expor-lhe uma das contradições que acho mais interessante nas ciências sociais que norteiam nossas ciências humanas e boa parte da filosofia atualmente. O problema torna-se maior no momento em que os problemas afetam a compreensão da história. Todas as ciências hoje, mesmo as naturais e principalmente as humanas, são consideradas históricas, ou seja, ligadas a seu tempo e as contingencias do momento.

Tu bem sabes que Emile Durkheim, um funcionalista, um dos mais eminentes deles, pois fundou a sociologia cientifica moderna, acreditava que a sociedade era um sistema em equilíbrio. Também não ignoras que Hegel acreditava que a história apesar da dialética, do conflito de movimentos opostos, tinha um caráter progressista e positivo, tinha um espírito, um rumo certo. E que o próprio Karl Marx era fatalista quanto a historia. Claro... Inspirou-se em Hegel (leu ao contrário a dialética, mas se inspirou). Acreditava que o fim natural do capitalismo como regime que se autodestrói seria o comunismo.

As visões dominantes da história se consideram esta mesma fruto da ação humana, nada mais natural, também tem uma visão determinística ou fatalista em sua base. Espinosa em sua religiosidade mundana também impunha um certo fatalismo, mas desta vez solidamente construído, pois está imerso ao próprio mundo. O que aprendemos, estudamos ou cremos sobre a história é exatamente o contrário: a história é feita pelos homens desde a Grécia Antiga, onde havia a intervenção dos deuses, mas a história era humana ainda. Vale destacar que nós humanistas, que acreditamos no livre arbítrio, no trabalho como construção do mundo, embasamos nossas teorias em paradigmas que são conservadores (o funcionalismo) ou fatalistas (dialética positiva de Hegel ou negativa de Marx).

Portanto se o materialismo histórico ainda fundamenta as principais teorias históricas, sociológicas, antropológico-culturais e por mais que o marxismo original tenha crescido ou se modificado com Antônio Gramsci ou com os Frankfurtianos, ainda sobra certo fatalismo de Marx. Como sobra certo conservadorismo de Durkheim em quem melhor juntou as teorias sociológicas modernas e as disciplinou coerentemente: Max Weber.

Quer dizer, sem dúvida somos todos induzidos a acreditar coerentemente na única tese aprazível ou possível que é a de que nós fazemos a história a cada momento de nossa vida, mas toda a base das teorias que fundamentam nossa ciência crê num destino... Curioso isso. Não?

segunda-feira, 19 de maio de 2025

Vamos conversar sobre política e ética?

 


Como a base da concepção de Hannah Arendt de política é a idéia grega de uma política que primeiramente era uma interação e que não se separava da ética, achei importante discutirmos a relação entre política e ética numa concepção moderna ou pós-moderna, na qual política e ética encontram grandes problemas em conviver.

É por isso que julgo importante tentarmos responder algumas perguntas como: Ética na política, existe? Que ética é válida? Servem-lhe os mesmos parâmetros das outras éticas? Existem éticas particulares? Origens diferentes? O lugar de Nicolau Maquiavel. Poder e Estado. A concorrência de grupos pelo poder. Eleições são representativas? Os partidos o são? Existem partidos?

Pretendo nestas poucas linhas traçar hipóteses, na verdade pra mim várias teses bastantes defensáveis, porém polêmicas por afrontar a visão predominante na sociedade acerca do fenômeno ou dos fenômenos envolvidos. A primeira tese que eu queria afirma que a política não é um ofício, mas sim uma atividade e que, portanto, não lhe pode caber um código de ética em hipótese nenhuma. Aos ofícios da administração pública sim, a eles cabe a ética no desenvolvimento das funções.

Outra consideração necessária, e nesta encontro sólido apoio, é a contestação a éticas específicas. Não adianta um técnico do saber prático respeitar o código de ética de sua profissão e ser eticamente um mau cidadão. Então entendemos que não se poderem usar várias éticas de acordo com a circunstância. Não se pode ter uma ética profissional, outra de cidadão e outra de parlamentar por exemplo. A ética pessoal, geralmente a de cidadão deve servir como orientação em todas as ocasiões. Aliás, o termo código de ética é uma contradição em si porque ética não pode ser imposta. Ética não pode ser lei. Ética deve ser aceita, escolhida, adotada.

Se você puder aceitar esse prelúdio como verdadeiro, pelo menos provisoriamente, poderei desenvolver teses outras mais a frente.

Apesar de não necessitar ser alvo de uma ética específica, se essa pudesse existir, a especificidade e importância da política provocam o desejo dos cidadãos de que algumas normas a norteiem. No entanto por terem naturezas diferentes, uma possível ética na política não pode se servir dos mesmos parâmetros que as éticas funcionais. É bom lembrar que eu estou fazendo uma concessão, não creio em éticas específicas para determinadas profissões, apenas consinto que existam adaptações de uma ética geral à situações específicas.

Nicolau Maquiavel, filósofo estudioso dos romanos e conselheiro de uma forte família florentina, da qual saíram muitos Papas numa época em que a igreja agregou ao seu poder temporal, o poder político, é o criador do mais eficiente, não diria ético, manual de fazer política: O Príncipe. Seus práticos conselhos são acatados por políticos das mais diferentes ideologias, origens e representatividade porque são extremamente eficazes. Ele enumera inúmeros meios, nada probos, para alcançar o fim último de se manter no poder. Então a política que classicamente tem incontáveis fins, nesse caso acaba tendo um principal, quando não único, esdrúxulo fim.

Muitos pensadores como o italiano Antônio Gramsci se dedicaram a estudar o poder e detectaram a necessidade sentida por ditadores personalistas ou grupos em particular de se manterem no poder. Gramsci desenvolve uma teoria interessante baseada na cultura para determinar os mecanismos que estes usam para manter a sua hegemonia, outro notável conceito desenvolvido pelo italiano. Na verdade há todos esses mecanismos e é necessário segurar uma hegemonia, que é sempre muito instável, porque inúmeros grupos concorrem por esse poder.

Todos esses mecanismos, muito melhores desenvolvidos e explicados após Gramsci, estão presentes na política do cotidiano seja num bar, escola, restaurante, teatro, no senado e mais nitidamente ainda nas eleições, onde os mais variados estudos chegam à conclusão de que os mitos e desejos são muito mais importantes para a decisão de voto que a racionalidade. Por essa razão, creio que as eleições, pelo menos racionalmente, não são representativas. Quanto aos partidos, se fossemos observar estritamente as condições necessárias para se constituir uma agremiação do tipo um objetivo em comum, ideologia clara e comum entre os participantes poderíamos taxá-los de massa de manobra, nunca de grupo.

Bom... me desculpem todo o contorno ao tema, o qual demonstrarei que foi válido. Eu já tinha negado a pertinência de éticas particulares. Havia afirmado que uma pessoa só pode ter como regra de conduta um conjunto de princípios que determina todo o seu comportamento seja como pai, filho, irmão, médico, advogado, torcedor de uma equipe esportiva ou senador. Falei da particularidade da política como uma atividade e não um ofício ou função, os quais são denominados pelos cargos públicos aos quais são eleitos. Depois me embrenhei pelo pensador que mais orienta os políticos a exercerem a política com eficácia e potência, mas considerando que embora seus conselhos sejam pertinentes e eficazes, os mesmos são quase sempre contrários a uma ética de convicção. Expliquei também o motivo da utilização do conselho do estudioso romano: a permanência no poder. Usei uma ideia de Gramsci para fazer um complemento do assunto e fechar a seção. Cabe-me explicar o porquê de tudo isso. O objetivo da ética é nortear o sujeito a fazer racionalmente as escolhas de modo a contemplar seu ideal de mundo. Então quando dizemos que o critério de voto nas eleições tem muito pouco de racional estamos tirando a ética do objetivo de todos os candidatos que quando a evocam se referem à imagem ou o mito dela, quando muito.

A política, conforme eu já havia dito, tem se esmerado nos conselhos de Maquiavel e até de Gramsci e seus posteriores para se manter no poder. Isso é de fato uma redução muito mesquinha da política. Creio que a política é a atividade mais ampla e absorsiva do universo. Como uma atividade ampla que abarca de alguma forma tudo, deve ser limitada por pouquíssimas regras. É bom lembrar, regras não são leis, acata-as quem concorda com a justeza destas. Certamente nenhuma atividade pode ter ética específica, muito menos a política como uma atividade negociativa, associativa ampla. Então todos devemos carregar nossas éticas pessoais para qualquer lugar que estejamos. Não creio que os políticos devam ser exceção. Eles devem usar a ética pessoal deles, mesmo estando representando eleitores que votaram neles. Ética não pode ser doada ou emprestada. O que eu gostaria de propor é que uma ética política poderia se fundar em três regras de ouro:

Sempre manter-se aberto ao diálogo;

Dialogar sempre com honestidade de intenções e princípios;

Explicitar sempre com clareza suas intenções e a origem delas.

Creio que o que eu consigo conceber até agora sobre o assunto é isso. Se você puder me ajudar com sugestões para melhorar a concepção, ficarei grato.

quarta-feira, 30 de abril de 2025

Um mundo imaginário

 


O mundo não existe. Pelo menos não objetivamente. Polêmica essa afirmação, mas facilmente explicável: o nosso mundo é um mundo de significação. As coisas não existem por-si-próprias (per-se). Todo o nosso mundo é mediado por nossa percepção, compreensão. Nietzsche afirmava que não há fatos, apenas interpretações. Se tudo no mundo é interpretado (o que é muito bom, pra não engolir a seco acriticamente), então vivemos num mundo subjetivamente construído.

Sendo assim, num mundo onde não existe uma verdade per-se, pois tudo nele é subjetivo, de modo em que nenhum de nós vive nos mesmos mundos, embora eles constantemente estejam se entrelaçando no que em matemática se chama interseção. Cada mundo é particular, pois cada um tem sua singular visão de mundo e das coisas que o cercam. Mesmo assim, conteúdos civilizatórios, contratos sociais, fazem com que muitas concepções sejam próximas ou coincidentes. Servem a este intuito, como já dizia Antônio Gramsci no início do século passado, educação, religião e a própria economia como determinadora do tipo de intelectual a ser formado.

Assim mesmo num mundo construído, esses consensos, interseções de conjuntos denominados mundos particulares, possibilitam criar uma espécie de “realidade”. Uma paranoia coletiva em cada um reafirma a imaginação do outro por estar certo de sua convicção, que vem a ser a mesma visão do outro. Assim, algo ideal se torna material. O idealismo subjetivo penetra o materialismo mais concreto e mais coletivo possível.

No entanto é preciso lembrar que essas proximidades nunca são, nem serão unânimes. Assim toda “realidade” é constantemente questionada. Dialeticamente o mundo evolui também neste ponto de vista (tese-antítese-síntese), pois a sociedade sempre tenta integrar os dissonantes, à força se preciso, e se não consegue simplesmente o elimina sua cidadania. Mas se modifica ao crescer do número de dissonantes. Assim é garantida a psicose coletiva. Assim conseguimos viver num mundo surreal, provavelmente mais belo e dramático do que seria a própria dita realidade objetiva.

O sabiá sabia assobiar

  Assim cantou o sabiá Como sempre Sabia assobiar Com a melodia assombrar E o ritmo encadear O sol sobe e a lua baixa As estrela...