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segunda-feira, 27 de janeiro de 2025

A verdade e o verdadeiro

 

É uma obrigação moderna conhecermos a verdade para manifestá-la mesmo quando estamos mentindo, isto é negando-a. Na modernidade, toda a natureza, isto é, todo o ambiente que nos cerca é matéria-prima para ser manipulada por nós. É nossa propriedade, por assim dizer. Sobretudo a verdade, nossa mais trivial matéria-prima. Tornamo-nos donos da verdade.

Poxa! Mas quanta besteira tu falas! Não há verdades universais! Nem que dois mais dois são quatro, pois é pura analítica, uma verdade que encerra a si mesma, que apenas admite verificação. Uma verificação inútil, pois apenas confirma a si mesma. Pois bem... Como é feito nosso pensamento? Nós não pensamos quase sempre através de preconceitos (de antes dos conceitos), de verdades prontas, anátemas, como tudo o que é líquido molha, os cisnes são brancos, nossos genes determinam quem nós somos ou a inversa: nós somos o que aprendemos ser. Mesmo todos sabendo que ninguém é. Tudo flui (panta-rei).

Temos verdades prontas que nos livram da dor de parir um conceito. Conceito não é uma coisa simples. Pode nascer de um insight, “um clique”, mas é preciso trabalhar muito um clique para delimitar seu universo, testar todos os limites, conhecer todo o universo particular “concebido”, conhecer suas propriedades. E mesmo depois de tudo isso, se maravilhar por ter construído um ponto de partida ou uma ponte para o que futuramente poderá ser aí sim um conceito.

As verdades nos dão uma enorme segurança num mundo pós-iluminista no qual as incertezas e o desconhecido são “buracos negros”, sugam-nos e nos jogam no limbo, na estranheza. Não admitimos estar num mundo desconstruído, tudo necessita ser palpável, abaixo de nós sempre terá um chão. É inadmissível andar pelo teto, mesmo que a Terra esteja de cabeça pra baixo. Temos uma orientação universal. Não importa se estamos de um lado ou de outro, acima ou abaixo: sempre abaixo de nós está o chão e acima o teto ou o céu. Alimentamo-nos de verdades inquestionáveis. Ai de quem as examine!

A modernidade morta nas artes e arquitetura, transformada na filosofia e nas ciências ainda é a doutrina nas nobres aplicações das ciências (engenharias e medicina) e da filosofia (pedagogia e direito). A maioria dos engenheiros, médicos, professores, advogados, juízes, promotores sabem que a razão iluminista falhou. No entanto, sabem que o uso delas manteve a eficácia. Um bom médico não pode se importar se a aplicação de um placebo com muito menores efeitos colaterais surte mais efeito que o fármaco indicado para a enfermidade. A não ser que seja um purista disposto a arriscar a saúde do paciente em nome de uma verdade. 

O sabiá sabia assobiar

  Assim cantou o sabiá Como sempre Sabia assobiar Com a melodia assombrar E o ritmo encadear O sol sobe e a lua baixa As estrela...