Acompanham

Mostrando postagens com marcador Popper. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Popper. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 6 de junho de 2025

A epistemologia de Habermas




Jürgen Habermas acredita que das diferentes maneiras de se tratar um problema, duas em particular ele questiona (das quais, obviamente, podem se extrair outras intermediárias): uma positivista, que descarta a compreensão em prol da objetividade, e outra hermenêutica, que descarta a objetividade ancorada em regularidades para buscar a compreensão de singularidades manifestas em situações específicas. Assim crê que a solução mais adequada seria substituir as abordagens unilaterais por uma epistemologia que equilibrasse esta dualidade básica.

Para o único expoente da Escola de Frankfurt não judeu, as ciências sociais são a área de maior conflito entre as ciências naturais e a hermenêutica. Ao usar um método fechado baseado nas ciências naturais áreas como a sociologia funcionalista ou estruturalista ganham segurança, mas perdem o poder interpretativo dos fenômenos sociais, pois necessitam restringir a área de atuação de cada pesquisa para que esta não saia do seu campo particular de cada estudo e se desespera a cada influencia ou relação externa. Por outro lado, ao usar um método hermenêutico-histórico, embora ganhe até um poder razoável de previsão, perde-se muito da razoabilidade e da precisão. Ambos os métodos podem estimular erros, pois o primeiro por ser muito fechado é cego á historicidade e demais dados externos a ele e o segundo necessita de travas que assegurem sua coerência.

Entretanto, Habermas não descarta nem a Hermenêutica de Gadamer, nem o positivismo de Popper. Aos dois direciona críticas como o caráter puramente “decisional” dos pressupostos metateóricos de Popper e o imobilismo da teoria de Gadamer, mas é influenciado tanto pelos criticados por ele critérios de demarcação de Popper quanto pelo historicismo de Gadamer.

Para Habermas, as ciências existentes são de três tipos: as ciências empírico-analíticas, as ciências histórico-hermenêuticas e as ciências críticas. Esses três tipos de ciências correspondem não apenas às três arestas do triangulo polêmico que opõe positivistas (Popper) e hermeneutas (Gadamer) aos integrantes da teoria crítica (Habermas),

mas também remetem mais profundamente a três interesses do conhecimento [...], respectivamente: a um interesse técnico, que comanda as ciências empírico-analíticas; a um interesse prático, que comanda as ciências histórico-hermenêuticas; e a um interesse emancipatório, que comanda as ciências críticas. [HUISMAN, 2001, p. 438].

 

As ciências empírico-analíticas são as ciências exatas, ciências da natureza ou ciências experimentais, as quais para Habermas correspondem à “lógica da investigação cientifica desenvolvida por K. R. Popper, [...] que [...] têm o caráter de um saber preditivo [...] e redundam numa possível utilização técnica” [HUISMAN, 2001, p. 438].

As ciências histórico-hermenêuticas correspondem às ciências humanas ou então as ciências morais. Estas “asseguram a comunicação entre um sujeito do conhecimento [...] e seu objeto, que é um outro sujeito simbólico e cultural [...], pelo emprego de uma interpretação de textos ou monumentos” [HUISMAN, 2001, p. 438]. A metateoria dessa ciência é a hermenêutica de H. –G. Gadamer.

As ciências críticas englobam a psicanálise e a crítica das ideologias. Deste modo encampa também “a sociologia crítica, a Teoria Crítica do próprio J. Habermas: elas tendem a desencadear uma reflexão crítica [...] que dissipa os bloqueios de comunicação” [HUISMAN, 2001, p. 438]. A ideia de uma autorreflexão, na forma de uma história natural da espécie humana se destina a evitar qualquer dicotomia entre o empírico e o transcendental. Isso equivale a evitar os perigos tanto de orientações excessivamente concretas do empirismo e orientações excessivamente abstratas da hermenêutica. A ciência como força produtiva é permitida, de acordo com Habermas, somente se acompanhada pela ciência como força emancipadora, por isso não rejeita o trabalho da ciência empírica, mas apenas interpretações naturalistas, positivistas ou transcendentalistas, que se sucedem desta.

O filosofo alemão Jürgen Habermas, pertence à segunda geração da Escola de Frankfurt e como tal compartilhava com seus companheiros de uma preocupação com a razão instrumental, que através da consolidação do domínio do capitalismo, da ciência e da técnica, invadiu todos os domínios da sociedade construindo uma sociedade unidimensional como Herbert Marcuse denominou a solidificação na sociedade de um discurso único dominante que abrange toda a oposição como parte de sua lógica na qual valores como a liberdade, a democracia servem tão somente para justificar uma falta de liberdade confortável.

Habermas tinha uma compreensão diferente da maioria seus anteriores na Escola quanto aos males da técnica. Essa visão possibilitou a ele construir uma alternativa à lógica tecnológico-científica que, para o filósofo, passou a invadir espaços indevidos. Assim, Jürgen Habermas distinguiu três tipos de atividades:

 

Atividade instrumental, que cruza ações orientadas para o sucesso com situações não sociais; a atividade estratégica, que cruza ações orientadas para o sucesso com situações sociais, e a ação comunicativa, que cruza ações orientadas para a intercompreensão com situações sociais. Por atividade instrumental é preciso entender, na esteira de Weber, ações orientadas para o sucesso, conduzidas segundo regras técnicas de ação. Pode-se avaliar seu grau de eficiência pela sua intervenção num contexto dado de estados de coisas. As atividades estratégicas também são ações orientadas para o sucesso, mas consideradas, dessa vez, sob o aspecto da busca de regras de escolha. Pode-se avaliar seu grau de eficiência pela influência que exercem sobre as decisões de um parceiro racional. A ação comunicativa não visa a exercer influência: é, ao contrário, uma atividade em que há procura, em primeiro lugar, de entender-se com outros, para em conjunto interpretar situações e entrar em acordo sobre planos de ação. (HUISMAN, 2000, p. 523 e 524)

 

Assim, Habermas até reconhece que a razão instrumental tem seu lugar: o mundo da produção e do trabalho, o mundo da ciência, que não se desliga do primeiro. Mas constata que há lugares na qual esta lógica não deveria imperar: notavelmente nas instancias sociais e políticas, onde a técnica não deveria substituir nem o convencimento, nem o acordo entre as pessoas.

Num mundo dominado pela lógica instrumental, na qual tudo, inclusive a linguagem, é um mero instrumento para alcançar determinado fim, Habermas, como um filósofo pragmático e analítico – portanto conhecedor de teorias filosóficas da linguagem e da hermenêutica – pôs-se a pensar numa alternativa à lógica dominante e opressora que havia se espalhado sobre todos os domínios. Habermas observa que:

 

As ações humanas (quando orientadas para o sucesso) têm como mediação o dinheiro (economia) e o poder (Estado). Mas o universo da intercompreensão tem como mediação os “atos de fala”. (HUISMAN, 2000, p. 524)

 

Habermas conhecia o trabalho de John Austin, para qual toda a linguagem é ação, dividindo os atos da fala em ilocucionários (quando a fala é a própria ação) e perlocucionários (quando a fala induz a ação). Austin conceituou também os atos locucionários, que apenas descreveriam fatos e ações, mas acabou por descobrir nada era simplesmente locucionário e que as três instâncias subsistiam simultaneamente numa mesma comunicação. Tinha, portanto, indícios de solução para resolver o seu problema: construir uma nova concepção da linguagem, ou melhor, da comunicação, para se tornar alternativa viável de uso nos domínios invadidos indevidamente pela razão instrumental. Assim livrando a linguagem de ser instrumentalizada indevidamente e as pessoas de serem alijadas de seu poder decisório.

Em suma, Habermas deseja resgatar a autonomia da linguagem, das pessoas, da política e das mais variadas instancias sociais que estavam, desde a consolidação do capitalismo como modo de produção dominante, tuteladas pela técnica. Esse foi o maior dos problemas a que Jürgen se dedicou ao conceber a ação comunicativa.

Em resposta ao problema diagnosticado por ele, a intervenção da razão instrumental sobre a linguagem, que após o advento da supremacia da hermenêutica na filosofia, passou a ser entendida como o fundamental, Habermas pensou a ação comunicativa. Assim através de uma ética mínima, através da comunicação as pessoas poderiam construir consensos para decidir sobre suas ações. Essa mínima ética versa que para haver comunicação três regras em três dimensões diferentes têm que ser respeitadas:

 

Nesse processo, é preciso reconhecer que, com cada ato de fala, os participantes da comunicação se referem simultaneamente a alguma coisa que é da ordem do mundo subjetivo, cujo pressuposto é a veracidade; do mundo social, cujo pressuposto é justeza; e do mundo objetivo, cujo pressuposto é a verdade. (HUISMAN, 2000, p. 524).

 

Assim para uma comunicação obter sucesso, que corresponde simplesmente a sua realização, é necessário que os participantes tenham a convicção de que os outros estão falando a verdade e sendo sinceros ao verbalizarem o que pensam e sentem. Mesmo que a intenção seja enganar, ou simplesmente influenciar, essas intenções devem ser escondidas sob a pena que se descobertas inviabilizarão a comunicação. Dessa forma Habermas restaura a dimensão político-decisória da sociedade porque na ação comunicativa as ações são decididas por um consenso obtido por uma comunicação, a qual já tem regras comuns e consensuais preestabelecidas e aceitas por todos os participantes do processo decisório. Ou seja, não há um critério externo que decide pelas pessoas, mas as próprias que decidem seus rumos.

Para Habermas, a subjetividade do indivíduo não é construída através de um ato solitário de autorreflexão, mas, sim, é resultante de um processo de formação que se dá em uma complexa rede de interações. Por isto que para o filósofo, o conhecimento e a própria constituição do ser é intersubjetiva e linguística. Por essa mesma razão, é que situa a ação neste mesmo horizonte. De quebra, com a solução pragmática que observa como a comunicação ocorre na prática, Habermas consegue desvincular a teoria da linguagem de uma base tecnocientífica, o que caso não ocorresse colocaria a teoria nos “braços” da lógica instrumental, a qual se nutre do domínio da tecnologia e da ciência sobre as demais áreas.

Ao propor que as ações no mundo social devam ser mediadas somente pela comunicação, Habermas retira a economia, a técnica e a tecnologia do papel primordial na discussão de um novo mundo. Nessa dimensão revolucionária, o filósofo, ao contrário de muitos de seus colegas da Escola de Frankfurt acredita que as pessoas podem nortear por suas próprias decisões seu próprio futuro, desde que o façam numa decisão intersubjetiva através da comunicação, da ação comunicativa.

 

Referencias:

HABERMAS, Jürgen. A lógica das ciências sociais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.

HABERMAS, Jürgen. Consciência moral e agir comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003.

HUISMAN, Denis. Dicionário de obras filosóficas. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

HUISMAN, Denis. Dicionário de Filósofos. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

 

 

 

O sabiá sabia assobiar

  Assim cantou o sabiá Como sempre Sabia assobiar Com a melodia assombrar E o ritmo encadear O sol sobe e a lua baixa As estrela...