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segunda-feira, 28 de abril de 2025

Linguagem, relativismo e democracia

 


A diferenciação e a separação, a fixação de certos momentos do conteúdo através da palavra não se limitam a neles designar uma determinada qualidade intelectual, mas na verdade, lhes conferem esta qualidade, em virtude da qual eles vêm a situar-se acima do mero imediatismo das qualidades ditas sensíveis. Assim, a linguagem torna-se um instrumento espiritual fundamental, graças ao qual realizamos a passagem do mundo das meras sensações para o mundo da intuição e da representação. (CASSIRER, 2001, p. 34).

Todo o mundo é mediado pela linguagem. O próprio pensamento desde Sócrates é concebido como um diálogo. Mesmo para Platão, no qual o pensamento era uma representação das formas ideais que não pertencem ao mundo físico, a mediação ainda era realizada pela linguagem. Martin Buber, milênios mais tarde conceberia o universo como dialógico.

Creio que não existe mais alguém que conceba as palavras como meros espelhos dos objetos, digo que creia que as palavras reproduzem fielmente características dos objetos, constituindo uma relação direta entre objeto e linguagem, sem o filtro da interpretação. Creio que estamos cônscios a muito tempo de que tudo é interpretado e passa por mil filtros de luz, sendo o da cultura o principal.

Assim fica muito complicado tanto sustentar o mito da objetividade que as ciências avocam para si. Bom... não só as ciências. Como também fica muito difícil delimitar o relativismo. Pois as interpretações são múltiplas e, poucos critérios consensuais existem para determinar se são válidas ou não. Estamos sempre sujeitos a impostura. Critérios são praticamente impostos em cada cultura. Sempre em prejuízo de um universalismo.

Ciências diferentes se baseiam em pressupostos distintos e podem analisar um mesmo fenômeno através de um mesmo método e chegar a conclusões diversas. Imagine então, meu anjo, essa ideia aplicada a intuição das pessoas. A intuição é o primeiro passo fora do conhecimento sensível. Não há conhecimento primário mais importante que a intuição para transcender os limites racionalidade empírica. Ninguém consegue saltar para além da física sem a intuição.

Cada ser humano, embora compartilhem de uma base cultural com muitas outras pessoas ou coincidentes em parte com um enorme número de grupos diferenciados entre si, possui uma concepção particular de mundo. Portanto uma percepção particular do mesmo. Representa o mundo, portanto, de uma forma singular. Embora possa compartilhar de uma mesma língua com milhões ou bilhões de pessoas, possui uma linguagem própria a ressinificar todo o mundo.

Assim, como fugimos da armadilha do relativismo? Que lugar comum podemos encontrar para não dispersar esses mundos? A ideia de que o mundo é permeado pela linguagem. Que a linguagem se tornou o próprio mundo já que desde Nietzsche somos tentados a acreditar que não há fatos, apenas interpretações? Isto é um Carrefour, um cruzamento e creio que nada de sobrenatural nos salva nessa matéria. Talvez a ideia de que cada um defenda seus princípios, em forma de discurso como queria Habermas e decida politicamente pela interatividade, a discussão para construir consenso seja a resolução mais próxima desse dilema. Mas isso é só minha particular opinião.

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