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sexta-feira, 26 de setembro de 2025

Conto do Felício

 


Era feliz Felício? Fora feliz pelo menos no início? Queria ser igual seu irmão Betinho, um Felizberto. Era chamado de felínio, felino na escola. Era um ser que se incomodava de ser considerado um gato. Gato Guerreiro talvez. Não gostava de ser comparado com um Pacato.

O felino era um tigre, uma onça, um guepardo? Betinho era um nome mais legal! Pelo menos era mais usual, comum. Felício pensava, pensava, pensava. Refletia demais. Isso gastava tanto seu tempo que nem sabia se era feliz.  Se eu fosse chutar, diria que seria muito feliz quando parasse de pensar tanto nisso.

Felício não tinha barba, mas ostentava um ralo bigode de tigre. Poucos, mas grossos pelos. Betinho não tinha pelos. Nenhum. Nem cabelo desde bebê. Felino, opa, Felício dobrava as esquinas com rara habilidade. Driblava os obstáculos e se pulava caia com majestosidade sobre as duas patas, digo, os dois pés.

Conhecia aquelas ruas como ninguém. Comera médias em praticamente todos aqueles bares. Conhecia dos hábitos matinais de todos aqueles boêmios daquela região. Guiava-se com extrema destreza no pequeno breu que antecede o nascer do sol naquela região de muitas luminárias queimadas ou quebradas. Sabia de cor a localização de todos os postes, arvores e samambaias pelo caminho.

Trabalhava desde muito cedo na pequena mercearia/restaurante árabe da região. O dono da mercearia, Tufic, só conhecia os clientes. Os conhecia muito bem. Mas muito pouco da região. Andava apenas do deposito pra loja. Da loja pro deposito. Caminho decorado. Vasos, porcelanas, aromas, sabores... O bastante para guiar o caminho com olhos vendados, ouvidos moucos daqui pra lá e de lá pra cá na sua usual trilha da entrada ao fundo da loja.

Cedo tinha que juntar moedas, trocar dinheiro, fazer o troco pelas ruas visitando os comércios um a um. Cumprimentando um a um pelas ruas e avenidas. Avaliando o trafego de transeuntes, o ritmo, as pausas. Tentando prever o movimento do dia na mercearia, o gasto. Conseguia prever quase com exatidão. Era puro instinto.

Era muito hábil. Contornava os obstáculos com muita malevolência.  Do mesmo modo driblava os clientes para atendê-los com mais rapidez. Fluía por entre as pessoas para tornar o ambiente confortável. E quando algum engraçadinho com excesso de cachaça se tornava incomodo, com enorme agilidade Felício o imobilizava. Nenhum arranhão sofria. Já o incauto azarado talvez fosse necessário tomar uma antitetânica. Felício tinha unhas maravilhosas e bem cuidadas, um tanto longas.

Vambora porque já é cedinho e Felício vira uma fera se não tomar seu pratinho de leite com cereais ou frutinhas. Eu que virei a noite inteira escrevendo esse texto vou dormir. Boa Noite, gente! Boa Noite, felino, quer dizer, Felício!

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