Sacada
Este vivera sempre em seu lugar. Bom isso
não me parece um bom começo de história...
Um dia sem qualquer aviso o tiraram do
lugar. Vixe!!! Parece que o começo piorou!!!
Bom... agora qualquer começo eu aceito.
Não sei é se o personagem vai aceitar. Quem me dera se não aceitasse e tivesse
um começo mágico na manga de seu palitó.
Aquele lugar onde sempre vivera
já não era mais o mesmo. Ele havia ruidosamente mudado de lugar. Não entendia.
Realmente não conseguia entender essas idéias malucas de mudar as coisas de
lugar. Também não compreendia nem lhe agradava a idéia daquele moço estranho de
escrever a sua história. Certamente ele daria uma dinâmica àquilo que foi
sempre estático: a sua vida. Tenho horror a mudanças, a movimentos, pensava
ele. Ainda se perguntava por que mudar algo ao qual já estava acostumado.
Aquilo era como se lhe dissessem que o sol não é o centro do universo.
Bom que sol não fosse o centro
do universo, isso nada lhe importava. Somente lhe importava que os sacrílegos
não viessem, incomodar a sua estabilidade. Sabia que mais dia, menos dia alguma
coisa mudaria, mas esperava estar morto antes disso. Aquela mudança o
inquietava. Era uma mera mudança do ângulo de visão, mas uma mudança em sua
vida tão certinha, tão perfeita, certamente teria efeitos catastróficos.
Estava muito confuso. Agora toda
a sua esquerda lhe parecia a direita antiga e a sua nova direita, a perfeita
visão de uma esquerda anterior. Todo o seu mundo havia rodado sem lhe pedir
permissão. Ele, um metódico por excelência, nunca faria aquilo a outro, mesmo
se a nova posição lhe aprouvesse um melhor panorama, pois sabia que mudar é
algo inquietante e desconfortável.
Como lhe diria um Camelo,
preferia não arriscar ganhar novas coisas pra não correr o risco de perder algo
que já possuía. Esse era o âmago de seu conformismo: nunca arriscar, pois
arriscar é arriscado, revelava redundantemente ele.
Aliás,
aquela mudança era extremamente inoportuna. Descobrira que agora tinha medo de
altura ao estar na sacada para o alpendre a três metros e vinte de altura.
Nunca tivera tamanho temor, medo que só era inferior ao de mudanças. Dessas
cada vez fica mais evidente o pavor que ele possui.
Alpendre
Aquele
local denominado de alpendre ou varanda era muito pequeno para ela, que ansiava
por liberdade. Aqueles muros a dez metros de distancia a sufocavam, embora
fossem vazados. Sentia que tinha pouco espaço naquele lugar e volta e meia
estava sempre por cima da cerca, ou melhor, de cerca em cerca para ver se
sentia ou apreendia algo novo que pudesse acabar com a monotonia daquele lugar
ao qual sempre voltava: o alpendre.
Jurava que seu próximo passo era pra longe
daquela prisão com muros abertos de concreto, muretas e cercas de metal e
madeira. Mas algo sempre a trazia de volta àquele local incomodo, ou melhor,
cômodo e confortável demais. Odiava comodidade. Era uma espécie de morte em
vida.
Não importava sua desilusão com as
necessárias paradas. Odiava dormir. Ah se pudesse dormir correndo e pulando as
muretas. Um dia vira o siamês de cima no alpendre. Ele parecia petrificado. Não
conseguia entender como alguém de sua natureza vivia tanto tempo imóvel,
impassível às mudanças. As mudanças sempre lhe remexiam, lhe dava uma espécie
de gastura por alguma ação.
Cômodos
e Alpendres
Nessa
nossa recortada história, aliás, nossa não porque é mais sua que minha. Eu não
consigo ver lógica nenhuma nessa história então deixei ao seu encargo, incauto,
de dar um nexo a essa narrativa (narrativa ou descritiva?). Bom... é fato que
cômodo um dia caiu da sacada e se estilhaçaria no chão se não o fosse a
técnica, malandragem e experiência da gata manchada.
Todos os
gatos sempre caem de pé. Aquela peça de tão acomodada caía de qualquer jeito.
Talvez esse excesso de comodismo fosse a causa de um corte longitudinal nas
suas costas e algumas rodas de metal que aparentemente ele tinha comido na
falta de outro cardápio. É um gato belíssimo, pensava a gata. O angorá não
pensava nada, nem agia, nenhuma reação se apreendia do gato.
A gata se
engraçava, se enveredava em volta daquele coração pétreo. De certa forma o
couro do gato também era muito consistente. Apesar da maciez dos pêlos, seu
couro ou seu corpo se mantinha imóvel e imoldável mesmo a um aperto mais
consistente da gata vadia. A felina logo se estressava diante da imutabilidade
do siamês. Pensava: é um esnobe. Mas como o alpendre, depois de suas
incontáveis voltas sempre estava lá de volta a ele.
Um dia o
dono da casa, ou um de seus pequenos filhos, ao sair de casa sem querer
pisoteou aquele cofrinho em forma de siamês. O gato se fez em pedaços. Quando a
gata voltou já não havia mais nada por lá. Apenas o alpendre que já não era
mais o suficiente. E a gata sumiu dali. A partir desse dia eu aprendi que
cômodos em alpendres não dão certo e que muitas vezes o resultado disso é
desastroso.
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