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sexta-feira, 29 de agosto de 2025

Conto do Bernardo

            


         Bernardo! Beernaardo! Bernardooo! Gritavam pra todo lado. Era um tal de Bernardo pra cá, Bernardo pra lá. Bernardo na torre. Bernardo no calabouço. Era uma solicitação infindável daquele criado. Ele estava por todos os lados e dado o volume de chamados em todos os outros não estava, mas estava chegando. Bernardo era pau pra toda obra. Madeira pra dar em doido.

Quanto mais atendia as solicitações, mais era convocado. Aprendera a dormir em pé. Encrustara um pequeno travesseiro de palha em seu chapéu de pano. Todos estavam impacientes porem bem felizes com ele. Insatisfeita somente a velha Bernarda que nunca tinha o filho nos almoços de domingo. Nunca degustara o ganso no molho de Champagne feito pelo filho.

Nem mesmo o biscoito de conhaque que Bernardo distribuía aos nobres pelo palácio. Bernarda não gostava de conhaque. Sua única folga era das cinco às sete da manhã aos sábados quando ia a igreja velha para colher cana aos fundos. Fazia torrões de açúcar pra colocar no chá.

Bernardo havia sido criado com o príncipe. Criado do príncipe que agora era rei consorte. Assistiu todas as aulas do então príncipe. Em algumas doutrinas aprendeu melhor que o rei mesmo sem caneta ou caderno. Sabia ligeiramente de tudo. Nada com a devida profundidade. Era o bastante pra conseguir atender as frivolidades da nobreza ou com nobreza as frivolidades.

Bernardo limpa meu colo! Olha a cozinha tá bagunçada! Ajeita a coleira do palhaço! Solta o cachorro! Devolve a sopa que ela tá quente! Sopra a sopa que tá gelada! Olha as horas, Bernardo! Bernardo, tô com sono! Bernardo, quero me aliviar! Era chamado pra tudo. Todos os nobres eram crianças. Não faziam nada sozinhas! Bernardo, talvez o mais novo deles, era o único adulto.

O solícito criado era intensamente apreciado. Fora uma das crianças mais lindas daquele reino. Hoje era um dos velhos mais acabados. Tinha lá os seus vinte e dois anos. Não era novo. Mas parecia ter quase cinquenta. Ou seja, parecia ter ido além da morte. Uma espécie de morto-vivo.

Dona Bernarda parecia mais nova. Tinha lá seus avançados trinta e oito anos. Não tinha muito mais tempo de vida. Mas não parecia já ter morrido como seu filho. Passava suas horas a tricotar. Dava sempre uma passadinha no estábulo para saber das ultimas novidades do reino. As notícias vinham sempre à cavalo. Principalmente as más.  Bernardo não tinha tempo de saber de nada. Não sabia das últimas. Nunca encontrara a mãe pra saber que era filho bastardo do rei. Não do rei atual, mas do pai dele. Mas também não gostaria de saber porque odiava fofoca!

        Bernardo! Beeernaaaardo! Bernardoooooooo! Ele pra lá e pra cá e pra todo lado. É tanta correria que eu até já me cansei. Não vou contar mais essa história. É muito difícil acompanhar Bernardo. Boa Noite! Vou me acomodar nas cocheiras. Bernardo, cadê minha palha?

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